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CRÓNICAS E ENTREVISTAS
SE EU MANDASSE...
Publicado em: 02/12/2021
Quando eras pequena dizias que querias mandar. Quando te disse que podias mandar no teu quarto, bateste o pé e gritaste: “Mas eu quero mandar muito!”
Querida Mãe,
Hoje acordei chateada por não ser eu a mandar no universo...
Aqui ficam dez coisas que seriam assim se fosse eu a decidir!
1. Ninguém se atrevia a dizer que o Pai Natal não existe.
2. Não havia Trabalhos de Casa.
3. Os fins-de-semana tinham três dias.
4. As películas aderentes nunca ficavam semirasgadas e impossíveis de recuperar.
5. A água do duche nunca, jamais, em tempo algum, ficaria fria a meio do banho.
6. O açúcar fazia bem à saúde.
7. Os dentes humanos eram como os dos coelhos, e cresciam sempre que fosse preciso.
8. As caixas plásticas tinham todas medidas e formatos padrão e as tampas cabiam sempre.
9. Era considerado absurdo andar com roupa engomada e com meias iguais.
10. Seria impensável um professor não deixar os miúdos irem à casa de banho em aulas de 90 minutos... Melhor dizendo, não existiam aulas de 90 minutos.
E obviamente que não havia covid.
E a mãe? O que proibia?
Beijinhos
***
Ana,
Quando eras pequena dizias que querias mandar. Quando te disse que podias mandar no teu quarto, bateste o pé e gritaste: “Mas eu quero mandar muito!” Daí não ficar admirada com a carta que me escreveste. E aproveitando a boleia do teu surto de autoridade, além de subscrever as tuas interdições, proibia:
1. O fecho das fronteiras. Quero que os teus irmãos celebrem connosco o Natal, e todos os emigrantes possam fazer o mesmo.
2. Que as dobragens dos desenhos animados das crianças sejam feitas com aquelas vozes estridentes e artificiais. Tenho a certeza de que os soundbites destroem os miolos dos miúdos e dos adultos nas redondezas.
3. Que os miúdos continuem a usar máscara ao ar livre na escola e fora dela. Sim, já sei das variantes, mas bolas, vacinaram-se eles, vacinámo-nos nós, e que pelo menos ao ar livre possam ver a cara uns dos outros.
4. Que se diga a uma criança ou adolescente que tem de ter mil cuidados com a desinfecção das mãos, as máscaras, as companhias, porque senão pode “matar” o avô ou a avó.
5. Que alguém entregue um presente, acrescentando: “Não sabia o que te havia de oferecer porque tens tudo!”
6. Que se continue a contar que é o Menino Jesus que deixa os presentes no sapatinho — para isso é que serve o Pai Natal, porque o Menino Jesus não pode discriminar crianças ricas de crianças pobres.
7. Festas de Natal das escolas em que são as educadoras/professoras que fazem tudo, tal o medo de que os meninos as deixem ficar mal se não forem perfeitos.
8. TPCs para as férias. Perderam aprendizagens com a pandemia? Certo, mas eles precisam mesmo de descansar a cabeça, senão é que não aprendem nada.
9. Os pais (e os avós) de entrarem em parafuso tal o medo de não ter o presente certo — ou suficientes! — para os seus meninos. Proibia-os também de dizerem aos filhos (e netos) que não querem que lhes ofereçam nada, ou de se contentarem com um desenho feito à pressa e sem empenho e cuidado.
10. Os pais de terem medo de dar aos filhos tesouras, canivetes, martelos e “coisas perigosas”, como se os miúdos não fossem capazes de aprender a usá-los. Ah, e proibia ainda, de condicionarem os presentes dos avós — ia preso quem refilasse contra as filhoses cheias de açúcar ou contra o avô que oferece ao neto adolescente o seu berbequim favorito. Já para os pais que sugerem que os avós devem dar dinheiro aos netos, pedia a pena máxima.
Está bem assim? É que posso continuar até aos Vinte Mandamentos se quiseres?
Beijos
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